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segunda-feira, 28 de maio de 2007

O tempo em um relógio de ouro

"Acreditando que o tempo passa melhor quando lemos, às voltas com grandes escritores, resolvi dividir minha leitura com vocês. Espero que busquem, assim como eu, grandes autores e obras para enriquecer-lhes o acervo pessoal."

Retirado de Obras Completas de Machado de Assis, volume II, Nova Aguilar, Rio de Janeiro, 1994, o conto “O relógio de ouro” inspiraria autores de novelas da rede Globo, certamente, se suas leituras fossem um pouco mais inteligentes.

Como esperar menos de Machado de Assis no quesito sarcasmo requintado? Pelo histórico do nosso cronista, contista, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista, romancista, crítico e ensaísta, a ironia não poderia ter sido mais bem colocada. Falar então da obra do nosso carioca não poderia ser mais redundante, ou se acharem melhor, seria “chover no molhado”. Seus romances são, dentre os nacionais, os mais lidos segundo as nossas professorinhas de primário, que volta e meia traumatizam seus alunos pela maneira com a qual nosso brilhante escritor lhes é apresentado. Mas nem é culpa delas – que saudade da professorinha – mas essa é outra história.

O conto em questão fala sobre a história de um relógio de ouro encontrado na casa de Luís Negreiros, mas não pertence nem a ele, nem a qualquer pessoa de que ele se recorde, muito menos a sua esposa, Clarinha.

A história se desenrola no momento em que Negreiros passa a desconfiar da fidelidade de sua esposa. A princípio, o próprio comportamento de Clarinha a condena, pois quando argüida por seu marido sobre o relógio acaba sendo evasiva e muitas vezes misteriosa, evitando dar respostas claras a seu marido.

Eis que quando o pai de Clarinha chega e se recorda do aniversário de Luís. O aniversário seria no dia seguinte, e Luís, sente-se aliviado por pensar que se tratava na verdade de um presente de sua esposa. Mas Clarinha continua se comportando estranhamente e se nega a fazer as pazes com o marido, mesmo depois de o mesmo se desculpar várias vezes pelo mal entendido.

O conto termina por nos surpreender. A dedução, a indução do pensamento, marcas de Machado de Assis, nos levam a desconsiderar as demais possibilidades pelo esgotamento das mesmas diante dos fatos apresentados. Buscando explorar a ironia nas atitudes mesquinhas dos homens, satirizando as relações sociais, o autor conclui simplesmente que o relógio era um presente enviado por uma amante a Negreiros, cuja carta foi interceptada antes, por sua esposa, dando-a motivo suficiente para agir da maneira que agiu durante todo o dia.

Em um conto suave, de fácil entendimento, embora se utilizando de palavras rebuscadas em função da época em que foi escrito, Machado brinca com a arte de se fazer ler e inspira a mente à meditação. Em termos comparativos, poderíamos concluir que há mais de uma “moral da história”, como: “pense antes de agir”; “quem não tem teto de vidro, que atire a primeira pedra”; e muitos outros ditos populares que se traduzem numa questão muito simples, a cobrança pelo que se quer ter, em virtude do que se faz para se obter aquilo que se quer.

Bruno Fernandes.

2 comentários:

Anônimo disse...

Bruno... bem lembrada a fase do traumatismo pós-Machado de Assis... rs. Fui fazer as pases com ele bem depois de terminar o Ensino Médio... e pra mim, não há conto mais bem contado que Entre Santos.. é fantástico!!!

E gostei muito do post... você "Em um conto suave, de fácil entendimento, embora se utilizando de palavras rebuscadas em função da época em que foi escrito", conseguiu me levar de volta a doces lembranças literárias... Obrigada!

Tonni Nascimento disse...

Ah que saudade da professorinha! Principalmente a de Ciências! rs.

Mas meu querido, culpar as pobres professorinhas do primário por esse "trauma" é maldade. Até porque nem elas conhecem a literatura nacional. Ficando desse modo impossível fazer que os outros gostem de algo que eu nem conheço mas estou divulgando.