São 11:30 da noite, acabei de entrar no táxi. Minhas mãos transpiram e não consigo controlar a pulsação. O ensaio foi perfeito. Amanhã, iremos passar a coreografia umas duas vezes... Ah, mas eu não me acalmo!
Eu sei quais são as minhas dificuldades. Sim, sim, batalhei muito nelas. Tantas vezes fiquei no teatro até amanhecer. Tudo escuro, só eu e o vigia que dormia. E nos últimos ensaios já nem errava mais.
Custou muito tudo isso. Há treze anos dedico minha vida ao ballet clássico, acrescenta-se aí seis anos de dança contemporânea. Muitos cursos, todos com bolsa de estudos. E mesmo assim, várias vezes quis desistir.
Para quê tudo isso? Esse esforço, esse sacrifício, por quê?... Meu corpo doído, portas que nunca se abriam e a competição que por tantas vezes me fez chorar! Me fez gritar: EU NÃO SOU CAPAZ! Eu não sou capaz – entre soluços, já baixinho, encolhida por fora e por dentro, incorporava o discurso dos algozes – você não é...
E o mundo dá voltas. Amanhã será o dia: o meu dia! A minha estréia como 1º bailarina da companhia.
Obrigada, eu disse ao motorista e lhe deixei o troco. Usei a escada. São só três andares. Mas, pensando bem, talvez, eu só quisesse adiar. A primeira coisa que vi: 1 recado na secretária. Fingi que não vi. Deixei cair a bolsa no sofá, a roupa pelo chão e a água sobre o meu corpo.
Hum...já se passaram 1 hora e 6 minutos do grande dia. Um sanduíche de peito de peru defumado, com requeijão light e pão integral cai bem com mate. É melhor ir olhar a correspondência enquanto como. Nada de mais. Alguns antigos professores me dando os parabéns e lamentando não poderem ir na minha estréia.
Ouço, enfim: “Amor, tentei falar contigo no celular, mas só dá fora de área. E aí... Como foi o ensaio? Tá morta, né?! Pena eu não poder ir aí só pra fazer massagem nos teus pés! (riso seguido de hesitação) Tu sabe que eu te amo... Eu te amo. (breve silêncio) Eu liguei mesmo, porque amanhã... amanhã, eu vou substituir um cirurgião que entrou de férias... erro do hospital... Desculpa, amor. Eu queria muito ir, mas você sabe... Vai dar tudo certo, tô torcendo por você. Beijo... Ah, e muita merda, tá?!”
Como se eu não soubesse que essa desculpa “telefone fora de área” é falta de coragem de falar comigo! Como se eu não soube que seria assim: Sozinha, mais uma vez! Como se eu não soubesse que mesmo sabendo ficaria decepcionada!
E dormir agora é impossível. Eu rolo, rolo e nada. Uma aflição, uma angustia. EU TÔ COM MEDO! E se eu errar? E se não for o meu melhor dia?! Como “ e se não for o meu melhor dia”?! Tem dia melhor? É a minha estréia! Mas, sozinha... com tanta bailarina querendo estar no meu lugar... Que pressão.
Minha cabeça doe... já não estou mais deitada. Olho pela janela a rua que começa a ter vida. O sol vem surgindo e pessoas também. Trabalho, escola... algumas voltam para casa. Sabe-se lá de onde vem. Alguns rostos já tinha visto mas, como na canção: “vejo gente repetida, mas nenhuma delas conhecida”.
Um dia qualquer para tantos, não para mim. E como eu queria que fosse. Vontade de não sair, de não encarar os olhares das cobranças e de não me encarar. Canto: “Medo, medo, medo vá pra longe de mim. Meu destino eu vou fazer e será bem feliz”.
É isso: Eu faço o que amo e dei duro por isso. Se eu cheguei aqui foi porque mereci. Profissionais confiam em mim e eu sei que mereço essa confiança. Eu também confio em mim.
Ah, que bom... um pouquinho de paz... Nossa, faltam 15 minutos para às 7 horas! Vou correr para cama antes que o sono fuja!
O interfone toca: Caramba, o pessoal já veio me pegar e eu dormindo... ainda bem que a bolsa já tá arrumada. “O sua louca, são 14:20. Tá atrasada. Quer deixar todo mundo doido! Imagina: Estrela de espetáculo some na estréia.” Tô indo, tô indo... e desço correndo!
Agora a angustia se transformou em ansiedade. E sabe que eu gosto dessa sensação?! Pura adrenalina. Toda a equipe a mil... uma euforia só. Gente zanzando pra cima e pra baixo! Conseguimos dar três passadas. Que alegria. A ansiedade aumenta. Porém, não há uma só voz, uma só expressão que indiquem desânimo... Somos só felicidade, expectativa e doação.
Hora de nos arrumarmos. Um ajudando o outro. “Eu não quero só a minha perfeição, quero a sua também” é o que mais se ouve. Me sinto como parte de um todo.
Eu sei quais são as minhas dificuldades. Sim, sim, batalhei muito nelas. Tantas vezes fiquei no teatro até amanhecer. Tudo escuro, só eu e o vigia que dormia. E nos últimos ensaios já nem errava mais.
Custou muito tudo isso. Há treze anos dedico minha vida ao ballet clássico, acrescenta-se aí seis anos de dança contemporânea. Muitos cursos, todos com bolsa de estudos. E mesmo assim, várias vezes quis desistir.
Para quê tudo isso? Esse esforço, esse sacrifício, por quê?... Meu corpo doído, portas que nunca se abriam e a competição que por tantas vezes me fez chorar! Me fez gritar: EU NÃO SOU CAPAZ! Eu não sou capaz – entre soluços, já baixinho, encolhida por fora e por dentro, incorporava o discurso dos algozes – você não é...
E o mundo dá voltas. Amanhã será o dia: o meu dia! A minha estréia como 1º bailarina da companhia.
Obrigada, eu disse ao motorista e lhe deixei o troco. Usei a escada. São só três andares. Mas, pensando bem, talvez, eu só quisesse adiar. A primeira coisa que vi: 1 recado na secretária. Fingi que não vi. Deixei cair a bolsa no sofá, a roupa pelo chão e a água sobre o meu corpo.
Hum...já se passaram 1 hora e 6 minutos do grande dia. Um sanduíche de peito de peru defumado, com requeijão light e pão integral cai bem com mate. É melhor ir olhar a correspondência enquanto como. Nada de mais. Alguns antigos professores me dando os parabéns e lamentando não poderem ir na minha estréia.
Ouço, enfim: “Amor, tentei falar contigo no celular, mas só dá fora de área. E aí... Como foi o ensaio? Tá morta, né?! Pena eu não poder ir aí só pra fazer massagem nos teus pés! (riso seguido de hesitação) Tu sabe que eu te amo... Eu te amo. (breve silêncio) Eu liguei mesmo, porque amanhã... amanhã, eu vou substituir um cirurgião que entrou de férias... erro do hospital... Desculpa, amor. Eu queria muito ir, mas você sabe... Vai dar tudo certo, tô torcendo por você. Beijo... Ah, e muita merda, tá?!”
Como se eu não soubesse que essa desculpa “telefone fora de área” é falta de coragem de falar comigo! Como se eu não soube que seria assim: Sozinha, mais uma vez! Como se eu não soubesse que mesmo sabendo ficaria decepcionada!
E dormir agora é impossível. Eu rolo, rolo e nada. Uma aflição, uma angustia. EU TÔ COM MEDO! E se eu errar? E se não for o meu melhor dia?! Como “ e se não for o meu melhor dia”?! Tem dia melhor? É a minha estréia! Mas, sozinha... com tanta bailarina querendo estar no meu lugar... Que pressão.
Minha cabeça doe... já não estou mais deitada. Olho pela janela a rua que começa a ter vida. O sol vem surgindo e pessoas também. Trabalho, escola... algumas voltam para casa. Sabe-se lá de onde vem. Alguns rostos já tinha visto mas, como na canção: “vejo gente repetida, mas nenhuma delas conhecida”.
Um dia qualquer para tantos, não para mim. E como eu queria que fosse. Vontade de não sair, de não encarar os olhares das cobranças e de não me encarar. Canto: “Medo, medo, medo vá pra longe de mim. Meu destino eu vou fazer e será bem feliz”.
É isso: Eu faço o que amo e dei duro por isso. Se eu cheguei aqui foi porque mereci. Profissionais confiam em mim e eu sei que mereço essa confiança. Eu também confio em mim.
Ah, que bom... um pouquinho de paz... Nossa, faltam 15 minutos para às 7 horas! Vou correr para cama antes que o sono fuja!
O interfone toca: Caramba, o pessoal já veio me pegar e eu dormindo... ainda bem que a bolsa já tá arrumada. “O sua louca, são 14:20. Tá atrasada. Quer deixar todo mundo doido! Imagina: Estrela de espetáculo some na estréia.” Tô indo, tô indo... e desço correndo!
Agora a angustia se transformou em ansiedade. E sabe que eu gosto dessa sensação?! Pura adrenalina. Toda a equipe a mil... uma euforia só. Gente zanzando pra cima e pra baixo! Conseguimos dar três passadas. Que alegria. A ansiedade aumenta. Porém, não há uma só voz, uma só expressão que indiquem desânimo... Somos só felicidade, expectativa e doação.
Hora de nos arrumarmos. Um ajudando o outro. “Eu não quero só a minha perfeição, quero a sua também” é o que mais se ouve. Me sinto como parte de um todo.
Hoje eu e toda a companhia somos um só: O ESPETÁCULO. Lindo, por sinal... tão intenso, tão verdadeiro... cheio de amor e vida!
Foi... ele aconteceu. Nós acontecemos. Tanto tempo nos preparando para este momento... foi especial... único... e estamos realizados. Um sucesso.
Foi... ele aconteceu. Nós acontecemos. Tanto tempo nos preparando para este momento... foi especial... único... e estamos realizados. Um sucesso.
Na porta do teatro, uma surpresa: Ele. Com flores... e um sorriso que arrancou um sorriso de mim. “Eu te amo”. Foi o que li em seus lábios, quando dizia “Parabéns”. De todos os que recebi, aquele foi o melhor, o único que guardei. Não faço idéia de como ele conseguiu chegar, mas estava lá. E aquele beijo foi outra estréia.
Amigos,
A vida é um espetáculo diferente a cada dia. Somos os artistas que emocionam a platéia, lhe arrancamos sorrisos, fazemos sonhar, refletir, se inquietar na poltrona, chorar, sentir-se triste. E experimentamos todas essas emoções também.
Vivamos, então. Comece cada dia como a estréia da sua vida, seu maior papel, sua oportunidade de ser... melhor, belo, bom... Doe-se, ame esse espetáculo.
Essa é a minha estréia no blog...
Thaís Dias
5 comentários:
Minha Linda! Todos nós já passamos por diversas estréias. Que essa seja tão especial quanto as outras pelas quais você já passou.
Seja bem vinda!
Parabéns pelo texto. Me identifiquei! huahuahua De certo que de maneira um pouco diferente, mas me identifiquei.
Boa mensagem, aprochegue-se!
Muito Bonitoo!!
Muito legal mesmo!!
Os dois textos! =D
Parabéns!!
Beijos e beijos...
Carol.
ok
Nossa! Isso é fantástico! Meus parabéns, Thaís!
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